No julgamento do Recurso Especial n. 1823083/AL, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou entendimento relevante quanto à aplicabilidade das sanções administrativas ambientais aos herdeiros de imóvel rural autuado por infrações ambientais cometidas pelo falecido proprietário. A controvérsia girou em torno da imposição de multa administrativa pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) ao herdeiro, a quem se atribuía responsabilidade pela infração ambiental detectada em propriedade herdada.
Diferença entre Responsabilidade Civil Ambiental e Penalidades Administrativas
O cerne da decisão reside na diferenciação entre a responsabilidade civil ambiental, de natureza propter rem, e a imposição de penalidades administrativas, que são de caráter pessoal. A responsabilidade propter rem tem fundamento no dever de reparar o dano ambiental, independentemente de culpa, recaindo sobre o proprietário ou possuidor do bem onde ocorreu a degradação.
Todavia, a penalidade administrativa, segundo o STJ, vincula-se ao poder sancionador do Estado, o que demanda a existência de nexo de causalidade entre a conduta infracional e o infrator.
Contexto da Decisão do STJ
No caso em questão, restou incontroverso que o herdeiro não concorreu, por ação ou omissão, para a prática do ato ilícito ambiental. Além disso, a multa administrativa foi aplicada após o falecimento do autor da herança, fato que inviabiliza a imputação de responsabilidade ao sucessor, haja vista que a penalidade de caráter sancionatório é de natureza personalíssima, não sendo transmissível aos herdeiros.
O STJ baseou-se na sua jurisprudência consolidada, bem como no disposto na Súmula 623, para reafirmar que as obrigações ambientais de reparação e restauração do meio ambiente possuem caráter real, transmitindo-se com o bem. Entretanto, a multa administrativa tem natureza subjetiva e depende da efetiva comprovação da conduta infracional do autuado.
Outro ponto crucial abordado pelo acórdão foi o princípio da saisine, consagrado no artigo 1.784 do Código Civil, segundo o qual a transmissão da posse e propriedade dos bens da herança ocorre automaticamente com o falecimento do autor da herança, independentemente de qualquer formalidade. Apesar disso, o tribunal destacou que a simples transmissão da propriedade por sucessão hereditária não é suficiente para imputar ao herdeiro a prática da infração administrativa. A infração, por sua própria natureza, exige a demonstração de culpa ou dolo por parte daquele que a comete, o que não foi demonstrado no caso concreto.
Conclusão:
A decisão do STJ reafirma que, enquanto as obrigações civis ambientais seguem o imóvel e se transmitem aos sucessores, as sanções administrativas possuem um caráter pessoal e, por isso, não podem ser impostas a terceiros que não participaram direta ou indiretamente do ilícito. O auto de infração, neste caso, deveria ter sido extinto com o falecimento do infrator, conforme orientações normativas internas do próprio IBAMA.
Em suma, o julgamento do REsp n. 1823083 estabelece um importante precedente quanto à delimitação da responsabilidade administrativa no direito ambiental, assegurando que a responsabilidade por infrações sancionatórias não se transmite aos herdeiros, exceto quando comprovada sua participação no ato lesivo. Tal entendimento fortalece a distinção entre a responsabilidade civil ambiental, de natureza objetiva e vinculada ao bem, e a responsabilidade administrativa, que demanda a caracterização da culpa para a imposição de sanções.
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